A loja já não era a mesma. Empoeirada, vazios nas prateleiras que eu tentava disfarçar desfazendo pilhas de alguns artigos e tapando os buracos. Meu pai naquele seu jeito tranquilo, que nada abalava, pelo menos aparentemente. No fundo, quem sabe estava a olhar para aquela desolação, a fuga da clientela, o dinheiro minguando. Sentindo o fracasso, depois de anos de luta, de viagens nos lombos de cavalos pelos sítios e povoados, sob sol e chuva, depois a loja na cidade bem sortida e frequentada.
Mas a coisa não ia bem. O dinheiro que a loja rendia mal dava para repor a mercadoria que se vendia aos poucos. Em algum momento ele havia se perdido na condução do negócio e já não dava mais para acompanhar o ritmo do comércio que acontecia no centro da cidade e que atraía as pessoas do bairro onde estava a loja. As pessoas passavam por ali para fazer compras na cidade e nós as víamos voltar com os pacotes comprados nos estabelecimentos mais atraentes do centro. Era com dor no coração que víamos a loja vazia nas noites que antecediam o Natal. As portas abertas à espera da freguesia e lá vinham as pessoas que nós, alvoroçados, pensávamos que iam entrar, mas que passavam reto, indiferentes. Hoje penso quão triste foi para o meu pai sentir essa falência. Teve que fechar as portas do negócio, como chamávamos a loja.